“A tua palavra é lâmpada que ilumina os meus passos e luz que clareia o meu caminho” (Sl. 119, 105)

por Irmã Anne-Catherine Avril

A palavra de Deus: amo a Palavra de Deus como amo o próprio Deus. Desta mesma forma, amo todas as pessoas.

Isso me acompanha. É o meu ponto de referência para a vida, para o discernimento, para a leitura do que ocorre em mim e à minha volta, nas pessoas que encontro e nos acontecimentos do mundo. É o que me conforta, desafia e dá coragem e esperança.

Na Sua Palavra, Deus sempre nos revelou que acompanha a nossa humanidade sem desanimar. Ele está sempre emergindo e se ocultando em seus meandros, desce em seus abismos e se eleva através da Palavra — e, desta forma, temos certeza de que ele realizará Seu projeto. Cada acontecimento desperta uma passagem, um versículo em mim.

Amo a Palavra de Deus como amo o próprio Deus

Estudei bastante a Palavra, no contexto da tradição judaica, e ainda A estudo. Eu A ensinei e ainda A ensino… de várias maneiras. Eu A ensinei em todos os lugares onde estive. Aos jovens: noviças na Congregação, peregrinos nas nossas hospedarias em Jerusalém; a judeus e muçulmanos na Bethlehem University; aos cristãos em nossos programas no Ecce Homo e no Centro Ratisbonne.

Um tipo de ensinamento que eu gostava muito era interagir com irmãos, irmãs e peregrinos que me pediam ajuda. Por exemplo, Wafaa é uma irmã egípcia de NDS; ela chegou com a Bíblia em árabe. Juntas — eu com a minha Bíblia em francês —, nos revezamos na leitura dos salmos em nossos respectivos idiomas. Eu checava minha Bíblia em hebraico, e conversávamos a respeito da leitura em inglês. Que bênção para nós duas! Aprendi que a Palavra de Deus cresce em comunidade de estudo e partilha.

Eis o relato sobre uma história vivida em Ein Karem: Itay é um judeu religioso que leciona literatura hebraica na Alemanha e vem regularmente dar palestras na Universidade de Jerusalém, em Givat Ram. Ele se hospeda conosco em Ein Kerem e solicita previamente comida kosher. Um dia, perguntei a ele por que havia escolhido nossa casa. Ele disse: “É ‘o’ lugar!”

Eu perguntei a ele se ele estudaria parashat ha-shavu’ah (a porção da Torá lida a cada Shabat) conosco. Ele o fez de bom grado.

Tenho vivido a Palavra de Deus na vida concreta

Uma vez, ao final de nossa sessão, ele me disse: “Você sabe o que diz a Mishná?”

“Quando dez ou cinco ou três estão juntos para estudar a Torá, a Shekina (a presença de Deus) está entre eles”.

Bem, eu vi a Shekina nos olhos dos participantes.

Tenho vivido a Palavra de Deus na vida concreta, especialmente no mundo judaico, compartilhando suas festas e eventos da vida cotidiana, vivendo as tensões, a guerra e o desafio da manutenção da paz em Israel.

Eu também amo isso por si só! Aprendi muito com a maneira judaica de ler a Escritura: ler nas entrelinhas, estar atenta a todos os seus “acenos e piscadelas”. Estou encantada com a língua hebraica e me delicio com o vocabulário dos Salmos todos os dias.

Tudo isso me permitiu compreender melhor quem é esse Deus Único de Israel e das Nações, graças ao povo judeu que nos transmitiu a Palavra; quem é Jesus, aquele mesmo Verbo (o Verbo estava com Deus), o Filho do Pai, que assumiu a nossa humanidade (e o Verbo se fez carne), que continua a acompanhar a humanidade, a abraçar a sua grandeza e as suas fraquezas, que cura e salva.

Tive mestres em Nossa Senhora de Sion e no povo judeu

O Espírito que flui, uma brisa que sopra onde quer, misteriosamente ali para revelar o “sentido” das Escrituras e a presença de Deus em todas as coisas.

Não descobri tudo isso sozinha: tive mestres em Nossa Senhora de Sion e no povo judeu. Acredito nessa verdadeira vida que passa de geração em geração através da transmissão. É a Congregação que vem guiando a minha vida para o aprofundamento da Palavra. E eu poderia citar pelo nome cada uma dessas pessoas que me chamaram, me desafiaram e me estimularam ao longo da minha vida.

Ben Bag Bag, o antigo sábio rabínico, costumava dizer: “Leia e releia a Torá, pois tudo está contido nela. Somente Ela lhe dará o verdadeiro conhecimento. Envelheça neste estudo e nunca o abandone. Você não poderia fazer nada melhor.” (Mishná Avot, V 25)